quinta-feira, 14 de abril de 2011

a chefia do Estado

Penso que teremos de pensar, num futuro mais ou menos próximo, no estatuto do Chefe de Estado no nosso ordenamento jurídico-constitucional. Em épocas de crise, como a que vivemos, mais clara ainda se nota o desacerto das soluções adoptadas em 1976-1985 relativamente às competências e ao próprio desenho do órgão de soberania Presidente da República. A questão deixa-se resumir num paradoxo: elegemos um Chefe de Estado pela maioria absoluta dos votos validamente expressos, algumas vezes a exigir votação em segunda volta; mas percebemos que as prerrogativas presidenciais são escassas, ou são as do costume. Poder de veto e poder de dissolução são praticamente os poderes de que o Presidente dispõe: um é ultrapassável; outro é a bomba atómica, a usar com parcimónia. No caso específico do veto presidencial, Cavaco Silva até inovou: anuncia que vetaria mas que não vale a pena e portanto não veta. Pelo contrário, promulgou ou assinou todos os decretos que são a causa eficiente da nossa desgraça colectiva. Só se preocupou - e com a carga joco-trágica ou cómico-dramática de que nos recordaremos sempre - com o beliscar dos seus poderes formais e em construir uma pequena família real em Belém (filhos e netos que, de modo obsceno, estão presentes nos happenings no Palácio, ao arrepio da natureza republicana do nosso regime).
Claro que alguns falarão dos poderes informais de que o Presidente da República dispõe: reunir semanalmente com o Primeiro-Ministro, convocar os partidos, dirigir mensagens, etc. Mas em momentos de grave crise nacional como a que vivemos, rapidamente percebemos que tais expedientes se tornaram rapidamente inócuos.
As opções são nítidas: ou Chefe de Estado eleito por um colégio eleitoral composto pela Assembleia da República e representantes "regionais", com os actuais poderes; ou evolução para um regime presidencialista à francesa, com aumento dos poderes e mandato único, eventualmente de seis anos.
Assim como está, com um Presidente que não ata nem desata, é que não podemos continuar.


(Banda das Três Ordens, privativa do Presidente da República como grão-mestre das Ordens Honoríficas Portuguesas)