quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Vou-me embora pra Pasárgada, de Manuel Bandeira

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.

(grafia em uso no Brasil, anterior à data de entrada em vigor do Acordo Ortográfico)

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Coisas verdadeiramente importantes


María del Rosario Cayetana Paloma Alfonsa Victoria Eugenia Fernanda Teresa Francisca de Paula Lourdes Antonia Josefa Fausta Rita Castor Dorotea Santa Esperanza Fitz-James Stuart y de Silva Falcó y Gurtubay - Duquesa de Alba de Tormes

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Ministério da Cultura


Numa nação civilizada - por maioria de razão,  numa nação tão ciosa da sua história e identidade, ainda que hiper-mitificada - haver Ministério da Cultura devia ser tão natural como haver Ministério da Justiça ou Ministério das Finanças. Mas parece que não é assim. E é tudo muito triste.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

a chefia do Estado

Penso que teremos de pensar, num futuro mais ou menos próximo, no estatuto do Chefe de Estado no nosso ordenamento jurídico-constitucional. Em épocas de crise, como a que vivemos, mais clara ainda se nota o desacerto das soluções adoptadas em 1976-1985 relativamente às competências e ao próprio desenho do órgão de soberania Presidente da República. A questão deixa-se resumir num paradoxo: elegemos um Chefe de Estado pela maioria absoluta dos votos validamente expressos, algumas vezes a exigir votação em segunda volta; mas percebemos que as prerrogativas presidenciais são escassas, ou são as do costume. Poder de veto e poder de dissolução são praticamente os poderes de que o Presidente dispõe: um é ultrapassável; outro é a bomba atómica, a usar com parcimónia. No caso específico do veto presidencial, Cavaco Silva até inovou: anuncia que vetaria mas que não vale a pena e portanto não veta. Pelo contrário, promulgou ou assinou todos os decretos que são a causa eficiente da nossa desgraça colectiva. Só se preocupou - e com a carga joco-trágica ou cómico-dramática de que nos recordaremos sempre - com o beliscar dos seus poderes formais e em construir uma pequena família real em Belém (filhos e netos que, de modo obsceno, estão presentes nos happenings no Palácio, ao arrepio da natureza republicana do nosso regime).
Claro que alguns falarão dos poderes informais de que o Presidente da República dispõe: reunir semanalmente com o Primeiro-Ministro, convocar os partidos, dirigir mensagens, etc. Mas em momentos de grave crise nacional como a que vivemos, rapidamente percebemos que tais expedientes se tornaram rapidamente inócuos.
As opções são nítidas: ou Chefe de Estado eleito por um colégio eleitoral composto pela Assembleia da República e representantes "regionais", com os actuais poderes; ou evolução para um regime presidencialista à francesa, com aumento dos poderes e mandato único, eventualmente de seis anos.
Assim como está, com um Presidente que não ata nem desata, é que não podemos continuar.


(Banda das Três Ordens, privativa do Presidente da República como grão-mestre das Ordens Honoríficas Portuguesas)

quarta-feira, 6 de abril de 2011

A Previdência

A notícia de que o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social irá adquirir títulos de dívida pública portuguesa faz-nos lembrar um tempo em que Salazar também se financiava forçando as instituições de  Previdência a comprar Obrigações do Tesouro, como os famosos Consolidados dos anos 40. A diferença está em que, nessa altura, a segurança social arrecadava muito e pagava pouco. Agora é o inverso.

segunda-feira, 14 de março de 2011

à rasca, II

O que aquela gente que se foi manifestar - e com toda a legitimidade - não percebeu, é que o protesto de um é antagónico do protesto do outro. Vi funcionários públicos desfilarem ao lado de «precários» que contestam o carácter «vitalício» da condição daqueles. Vi uma classe média que protestava contra os impostos, que irão pagar os vencimentos de alguns dos elementos dessa mesma classe média. Vi «artistas» a exigirem subsídios a serem pagos pelos «pequeno-burgueses» que ao seu lado caminhavam e protestavam. Vi professores a protestar - e com toda a legitimidade - contra o seu absurdo sistema de avaliação, ao lado de desempregados que não podem sequer fazer ideia que se possa protestar por uma coisa dessas. Vi anarcas, bloquistas, comunistas, nazi-fascistas, jotinhas diversos, reformados, pais de «precários» (que, muitos deles, nunca procuraram emprego nenhum), alguma vagabundagem. Une toda este gente um justificável ódio a José Sócrates. Convenhamos que, para programa político, é pouco. O day after é nada: a Revolução não é possível, nem desejada pela maior parte dos manifestantes. O passo seguinte é o passo habitual do nosso Rotativismo atávico.

quarta-feira, 2 de março de 2011

Na morte de Jane Russell



Onde se prova que apesar de os homens prefererirem as louras (Gentlemen prefer Blondes), acabam por casar com as morenas (Gentlemen Marry Brunettes).

terça-feira, 1 de março de 2011

Jane Russell (1921-2011)




Antes do Gesto e do Peito das Sofias Loren, das Ginas Lollobrigida, das Silvanas Mangano e das Claudias Cardinale havia o que a Russel Antiga Mostrava

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Essenciais, 11

"Terras de Portugal que dão rochedos,
A urze, a inveja, o ódio... e pouco mais"

Teixeira de Pascoaes, Sempre

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Livro do ano de 2010 - Novelas Exemplares, de Cervantes


Não é pedantismo nem pose estudada, corolário de muitas ignorâncias - garanto. Mas não consigo imaginar que o livro do ano de 2010 (ainda que do final dele) possa ser outro que não a nova tradução das Novelas Ejemplares, de Miguel de Cervantes Saavedra, mais de cinquenta anos depois da «versão» de Mestre Aquilino. Vou mergulhar.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Reduções remuneratórias

A propósito das reduções dos vencimentos dos funcionários públicos, decretadas pelo artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2011, recorde-se o que escreveu Marcello Caetano a páginas 759 do II volume do seu incontornável Manual de Direito Administrativo.  Segundo o famoso administrativista, a redução salarial "importaria para o funcionário uma degradação ou baixa de posto que só se concebe como grave sanção penal."

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Matthew Lipman (1922-2010)

Morreu o criador da Filosofia para Crianças. Sempre me fez muita impressão esta coisa de dar dignidade filosófica às interrogações naturais, ainda que de teor vagamente metafísico, bem como às perplexidades semânticas das crianças. O pensamento filosófico assenta no trabalho conceptual e argumentativo - para o qual existem técnicas susceptíveis de serem aprendidas - sobre os problemas. Os problemas são, hegelianamente, a colheita da tarde; as crianças são a manhã do Mundo. «A ave de Minerva só levanta voo ao entardecer.»

Resistência

Habituados a viver no seio de uma ampla maioria católica e, dentro desta, apenas e só da Igreja Latina, é-nos difícil imaginar a situação vivida pelas minorias significativas de cristãos - e não apenas de católicos - que convivem com outras religiões claramente maioritárias, designadamente no Médio Oriente. Mais grave ainda do que o relativo desconhecimento que, no Ocidente, temos desta situação, é a própria dificuldade de nos vermos como minoria.
O recente atentado contra fiéis da Igreja Ortodoxa Copta - umas das «Antigas Igrejas do Oriente - em Alexandria, vem chamar a atenção para a situação aflitiva em que vivem estas comunidades religiosas um pouco por todo o Oriente. Greco-Ortodoxos, Maronitas (católicos), Assírios (Igreja Assíria do Oriente) e Caldeus (católicos), Sírios e Greco-Melquitas, Arménios e Coptas (ortodoxos e católicos), Sírio-Malabares e Sírio-Malankares na Índia e Greco-Católicos na Ucrânia, Latinos no Oriente e na Terra Santa, na Rússia e na China constituem-se como autênticas igrejas da Resistência no seio de esmagadoras maiorias muçulmanas, hindus ou mesmo de outras denominações cristãs (caso da Igreja Ortodoxa Russa que pretende ter o monopólio da pregação no Oriente eslavo) ou vítimas do poder totalitário do Estado (caso da situação da Igreja Católica Romana na China).