segunda-feira, 12 de abril de 2010

O costume

Diz Daniel Oliveira (com quem a maior parte das vezes não concordo):

"Passos Coelho não precisou de mais do que 15 dias para usar a mais fácil das receitas: alimentar o ressentimento contra as principais vítimas da crise. [...]
Vou tentar explicar isto devagarinho: aqueles que recebem, por exemplo, o subsídio de desemprego são os mesmos que pagaram as suas prestações à segurança social. Eles deram a sua parte. O que recebem não é nem uma esmola nem um favor. É um direito. Um direito pelo qual pagaram ao longo dos seus anos de trabalho e descontos. O dinheiro não é nem de Sócrates, nem de Passos Coelho, nem das juntas de freguesia ou ONG’s onde os querem pôr de castigo. É deles. Foi pago por eles. Eles são a sociedade que deu e que agora recebe. Que foi solidária e que agora precisa da solidariedade. Não são criminosos condenados a “trabalho para a comunidade”. [...]
É assim que estes senhores, de Paulo Portas a Pedro Passos Coelho, querem os cidadãos: a esgatanharem-se pelas migalhas que sobram. Convencidos que a culpa da sua miséria é do miserável que mora ao lado. E um dia destes, convencidos que culpa da sua miséria é deles próprios.
Assim, entretidos uns com outros, não põem em causa os fundamentos da desigualdade social neste país. Assim, espalhando as culpas pelas aldeias, estaremos todos dispostos a exigir menos. A olhar para os direitos que demorámos décadas a conquistar como privilégios. Prontos para sermos aliados de quem quer destruir esses direitos em vez de lutarmos pelos nossos.
Por mim, sei o que a história nos ensinou: que dividir para reinar sempre foi a melhor estratégia. E que a ela só se resiste percebendo que aqueles que vivem do seu trabalho só têm uma força que os salve: tomar cada ataque a um direito de alguém da sua condição como um ataque a si próprio.
A função do discurso contra os supostos “direitos adquiridos” (que se deviam chamar direitos conquistados e ainda por conquistar) é simples: transportar o trabalhador de novo para o século XIX. Mas talvez quando voltarmos todos a trabalhar à jorna e nada nos segurar no desespero do desemprego voltemos a perceber quem são realmente os privilegiados.

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