Hoje, que está tanto calor - «um calor de ananases» - relembro o Eça:
"Pela escada, o poeta das LAPIDÁRIAS aludiu ao tórrido calor de Agosto. E eu que nesse instante, defronte do espelho no patamar, revistava, com um olhar furtivo, a linha da minha sobrecasaca e a frescura da minha rosa--deixei estouvadamente escapar esta coisa hedionda:
- Sim, está de escachar!
E ainda o torpe som não morrera, já uma aflição me lacerava, por esta «chulice» de esquina de tabacaria, assim atabalhoadamente lançada como um pingo de sebo sobre o supremo artista das LAPIDÁRIAS. O homem que conversara com Hugo à beira-mar!... Entrei no quarto atordoado, com bagas de suor na face. E debalde rebuscava desesperadamente uma outra frase sobre o calor, bem trabalhada, toda cintilante e nova! Nada! Só me acudiam sordidezes paralelas, em calão teimoso: - «é de rachar»! «está de ananases»! «derrete os untos»!... Atravessei ali uma dessas angústias atrozes e grotescas, que, aos vinte anos, quando se começa a vida e a literatura, vincam a alma - e jamais esquecem."
(da 1.ª ed. (1900), exemplar da Biblioteca Nacional)
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